Fundamentos de Asset Liability Management (ALM)
Introdução
Bem-vindo ao FinDynamics sobre Asset Liability Management (ALM), ou Gestão Ativo-Passivo. Nesta oportunidade, exploraremos como instituições financeiras e investidores gerenciam em conjunto seus ativos e passivos para garantir equilíbrio financeiro de longo prazo. Abordaremos conceitos-chave como duration (duração), adequação de passivos, riscos de descasamento e estratégias de hedge com derivativos, sempre com uma linguagem acessível e exemplos práticos.
O objetivo é que, ao final deste material interativo, você seja capaz de entender a importância do ALM e como aplicá-lo na prática, especialmente em contextos de previdência e seguros. Além disso, traremos um estudo de caso real da Brasilprev (2020-2024) para ilustrar os desafios de ALM diante de mudanças econômicas abruptas.
Objetivos de aprendizagem:
- Compreender o conceito de ALM e sua importância na gestão de riscos.
- Entender o que é duração e como o matching de duration de ativos e passivos pode reduzir risco de juros.
- Aprender sobre o Teste de Adequação de Passivos (TAP) e por que ele é importante para seguradoras e fundos de pensão.
- Identificar riscos de descasamento entre ativos e passivos e estratégias de casamento para mitigar esses riscos.
- Conhecer o uso de derivativos (swaps, contratos futuros) como instrumentos de hedge no ALM.
- Analisar o caso Brasilprev (2020-2024) para ver o ALM em um cenário real e desafiador.
ALM: Conceitos Básicos e Importância
ALM (Asset Liability Management) refere-se à gestão coordenada de ativos e passivos de uma instituição, visando equilibrar prazos, fluxos de caixa e indexadores de modo a minimizar riscos financeiros. Em outras palavras, é uma técnica de gerenciamento de risco que busca evitar o descasamento entre ativos e passivos:contentReference[oaicite:0]{index=0}. Ao equilibrar essas duas pontas, a empresa melhora sua estabilidade financeira, garantindo maior segurança e rentabilidade sustentável.
Para entender melhor, lembre que ativos são os investimentos e recursos que geram fluxos de caixa futuros (por exemplo, títulos, ações, imóveis, caixa etc.), enquanto passivos são as obrigações e dívidas a pagar em determinados prazos (como empréstimos tomados, reservas técnicas para pagamentos de benefícios, provisões, etc.). O ALM analisa as características desses ativos e passivos – como prazo de vencimento, taxa de juros, indexadores (inflação, câmbio), liquidez – e busca estratégias para alinhá-los.
Em um banco, por exemplo, o ALM envolve administrar a diferença entre prazos de captação (depósitos dos clientes, normalmente de curto prazo) e de empréstimos concedidos (créditos de longo prazo). Já em um fundo de pensão ou seguradora, o ALM é crucial para garantir que os investimentos (ativos) sejam suficientes para pagar benefícios futuros (passivos) nas datas e termos prometidos.
Quando o ALM é bem executado, a instituição consegue se proteger melhor de mudanças econômicas. Por exemplo, se os juros subirem ou caírem, ou se a inflação variar além do esperado, um bom casamento entre ativos e passivos fará com que o impacto seja mínimo sobre o resultado, pois ganhos e perdas se compensam em ambos os lados.
Por outro lado, uma gestão inadequada do ALM pode trazer consequências graves. Se os ativos não forem suficientes ou adequados para cobrir os passivos, a instituição pode enfrentar déficits, necessidade de aportes emergenciais de capital ou até insolvência no longo prazo. Veremos adiante um caso real onde um descasamento significativo causou prejuízos e necessidade de intervenção dos acionistas.
Quiz: Conceitos de ALM
Q1: Qual é o principal objetivo do Asset Liability Management (ALM)?
Incorreto. O ALM não busca maximizar lucros a qualquer custo, e sim equilibrar risco e retorno, garantindo segurança na gestão de ativos e passivos. Correto! O objetivo central do ALM é alinhar características de ativos e passivos (prazos, fluxos de caixa, indexadores) para reduzir riscos de descasamento e garantir equilíbrio financeiro. Incorreto. O ALM não dita que tipo de ativo investir, mas sim que haja coerência entre os ativos escolhidos e as obrigações (passivos) da instituição. Pode-se investir em diversas classes, desde que compatíveis com os passivos. Incorreto. Embora um bom ALM reduza riscos e, consequentemente, a chance de aportes extras de capital, ele não elimina a necessidade de capital próprio. Sempre há riscos residuais e exigências regulatórias de capital.Q2: Em qual das situações abaixo o ALM é mais importante?
Incorreto. Se a empresa não possui passivos relevantes, o ALM tem papel limitado, pois não há um compromisso futuro a casar com os ativos. Correto! Fundos de pensão possuem obrigações de longo prazo (pagamento de aposentadorias) e precisam investir as contribuições em ativos adequados. O ALM é crucial para garantir que esses pagamentos futuros possam ser feitos, mesmo com oscilações econômicas ao longo do tempo. Incorreto. Investimentos individuais de curto prazo não envolvem o conceito de casar ativos e passivos, pois normalmente não há passivos definidos a gerir. O ALM se aplica mais a instituições com obrigações futuras significativas. Incorreto. Embora qualquer empresa deva gerir ativos e passivos, o ALM é particularmente crítico em instituições financeiras, seguradoras e fundos de pensão, onde há um volume grande de obrigações financeiras a honrar em prazos diversos.Q3: O descasamento entre ativos e passivos pode resultar em:
Incorreto. O descasamento tende a aumentar a volatilidade e o risco financeiro, não a estabilidade. É o casamento (matching) adequado que traz estabilidade. Correto! Se os passivos crescem além do retorno dos ativos (devido a um descasamento de indexadores ou prazos), a empresa pode enfrentar déficit, exigindo aporte de capital pelos sócios ou liquidação de ativos em hora ruim para cobrir o buraco. Incorreto. Na verdade, um descasamento aumenta os riscos de mercado (como risco de juros, inflação, câmbio). O ALM busca justamente mitigar esses riscos alinhando ativos e passivos. Incorreto. Descasamentos trazem incerteza aos resultados. Lucros garantidos só seriam possíveis (em teoria) com um casamento perfeito e sem surpresas, o que na prática é difícil. Um descasamento, portanto, está longe de garantir lucro — pode gerar perdas significativas.Duration: Medindo o Risco de Juros
Um conceito fundamental no ALM é a duration (duração). A duração de um ativo financeiro de renda fixa, como um título ou uma carteira de títulos, representa o prazo médio em que são recebidos seus fluxos de caixa (cupons e principal), ponderados pelo valor presente. Em termos simples, é uma medida expressa em anos que indica quanto tempo, em média, o investidor leva para reaver seu investimento. Esse conceito é muito útil pois também serve como aproximação da sensibilidade do preço de um título a mudanças na taxa de juros: quanto maior a duração, mais o preço do título varia para uma dada mudança nos juros.
Algumas características importantes da duração:
- Um título sem pagamentos intermediários (zero-cupom) possui duração igual ao seu prazo de vencimento. Ex: um título que vence em 5 anos e não paga cupons tem duration = 5 anos.
- Um título com cupons periódicos terá duração menor que o seu prazo final, pois parte do dinheiro é recebida antes do vencimento. Quanto maiores ou mais rápidos os cupons, menor a duração. Ex: um título de 5 anos com cupons semestrais terá duração menor que 5 anos, porque o investidor recupera uma parte do valor a cada semestre.
- Um título pós-fixado diário (por exemplo, Tesouro Selic ou LFT, atrelado à taxa diária DI/Selic) tem duration muito baixa, próxima a zero, pois sua rentabilidade se ajusta diariamente – o investidor não fica exposto a oscilações de taxa ao longo do tempo.
Por que a duração é tão relevante no ALM? Porque ela permite casar o risco de juros dos ativos com o dos passivos. Se um passivo (por exemplo, o compromisso de pagar uma renda em datas futuras) tem duração de 7 anos, isso significa que sua sensibilidade a mudanças na taxa de desconto é equivalente a um título de 7 anos. Para protegê-lo de oscilações de juros, o gestor pode montar a carteira de ativos com duração aproximada de 7 anos. Assim, se os juros subirem ou caírem, o valor presente dos ativos e dos passivos irá mudar em magnitude semelhante, mantendo o equilíbrio.
Em termos práticos, a duração nos dá uma aproximação: Variação de preço ≈ – (duração) × (variação da taxa de juros) (para pequenas mudanças em taxas). Por exemplo, se um título tem duração de 5 anos, uma alta de 1 ponto percentual na taxa de juros resultaria em uma queda de aproximadamente 5% no preço desse título. Da mesma forma, para um passivo de duração 5, seu valor presente cairia cerca de 5% com +1 pp na taxa (ou subiria ~5% se a taxa caísse 1 pp).
O gestor de ALM busca então reduzir o gap de duration (diferença entre a duração média dos ativos e a dos passivos). Quanto menor esse gap, menos sensível o patrimônio líquido da instituição fica a mudanças nas taxas de juros. Essa técnica é conhecida como imunização de carteira: alinhar a duração dos ativos à dos passivos para “imunizar” a entidade contra variações moderadas de juros.
É importante notar que a imunização por duração funciona bem para mudanças pequenas e paralelas na curva de juros. Movimentos muito bruscos ou alterações na forma da curva (mudança diferente em juros curtos vs. longos) podem exigir ajustes adicionais (por exemplo, levar em conta a convexidade ou usar derivativos para hedge mais fino).
Exemplo Numérico Simplificado
Considere dois títulos, ambos com valor de face de R$1000, sem risco de crédito, em um cenário de taxa de juros constante de 10% ao ano, para simplificar:
- Título A: Zero-cupom que vence em 2 anos, pagando R$1000 no final.
- Título B: Cupom anual de R$100 (10% do valor de face) e pagamento de R$1000 no final do 2º ano.
A duração do Título A é exatamente 2 anos, pois ele só paga no final. Já o Título B paga uma parte no ano 1 e o restante no ano 2. Se calcularmos sua duração (ponderando os tempos pelos valores presentes recebidos), encontraremos que é menor que 2 anos. Intuitivamente, isso ocorre porque recebemos R$ 100 já no primeiro ano, reduzindo o tempo médio de recebimento. De fato, se descontarmos os fluxos do Título B a 10% ao ano:
- Valor presente do fluxo no ano 1: 100 / (1 + 0,10) = R$ 90,91
- Valor presente do fluxo no ano 2 (R$ 1100, incluindo principal + cupom): 1100 / (1 + 0,10)2 = R$ 909,91
- Valor presente total ≈ R$ 1000 (como esperado para um título justo a 10%)
- Duração ≈ (1 × 90,91 + 2 × 909,91) / 1000 = (90,91 + 1819,82) / 1000 = 1,91 anos
Ou seja, o Título B tem duração aproximada de 1,91 anos, menor que os 2 anos do Título A. Esse exemplo ilustra que pagamentos antecipados reduzem a duração. Para o gestor de ALM, importar-se com essas diferenças significa que, se seus passivos vencem em cerca de 2 anos, talvez seja preferível investir no Título B do que no Título A, pois o B tem duração mais próxima da dos passivos (especialmente se os passivos também tiverem alguns pagamentos intermediários).
Quiz: Duration
Q4: A duration de um título de renda fixa mede:
Correto! A duration é o prazo médio, ponderado pelo valor presente, de recebimento dos fluxos (cupons e principal) de um título. É medida em anos. Incorreto. O prazo final (maturidade) é apenas uma parte. A duration coincide com o prazo final apenas em títulos zero-cupom. Se houver cupons, a duration será menor que o prazo de vencimento, pois considera os pagamentos antecipados. Incorreto. A duration não é uma taxa, mas sim um tempo médio. Ela não indica a taxa de juros, e sim a sensibilidade do preço do título à variação da taxa de juros. Correto! Essa é outra forma de entender a duration: é aproximadamente o tempo necessário para reaver o investimento inicial através dos fluxos recebidos. Por isso ela serve de medida de risco de juros.Q5: Se a duration de um título é 5 e a taxa de juros sobe 1% (de forma inesperada), o preço do título:
Incorreto. A relação é inversa. Se os juros sobem, o preço do título cai. Uma duração de 5 indica uma queda de aproximadamente 5% para um aumento de 1 ponto percentual na taxa de juros. Correto! Duration 5 significa que, para uma pequena variação na taxa, o preço varia cerca de 5% na direção oposta. Portanto, +1pp na taxa implica aproximadamente -5% no preço do título. Incorreto. A duration justamente indica a sensibilidade do preço às variações de juros. Se a taxa varia, espera-se que o preço mude conforme a duração (ao menos aproximadamente). Incorreto. O rating do emissor afeta o risco de crédito, não diretamente a relação preço-juros. A duration foca no risco de taxa de juros, assumindo que não há default.Q6: Comparando os títulos abaixo, qual terá a maior duração?
Correto! O título de 10 anos sem cupons tem duração = 10 anos, pois paga tudo só no final. Esse é o maior prazo médio de recebimento dentre as opções. Incorreto. O Título B paga cupons ao longo dos 10 anos, então sua duração será menor que 10 anos (parte do dinheiro é recebida antes do vencimento). Incorreto. O Título C tem duração 5 anos (já que é zero-cupom de 5 anos). É menor que a duração do título A (10 anos). Incorreto. O Título D teria duração menor que 5 anos devido aos cupons semestrais, portanto certamente não é o de maior duração dentre os listados.TAP: Teste de Adequação de Passivos
O Teste de Adequação de Passivos (TAP) é um procedimento contábil-atuarial utilizado por seguradoras, entidades de previdência e outras empresas com obrigações de longo prazo para verificar se os passivos estimados estão adequadamente cobertos pelos ativos e reservas disponíveis:contentReference[oaicite:2]{index=2}. Em outras palavras, o TAP avalia se a empresa tem recursos suficientes para honrar todos os seus compromissos futuros, dado um conjunto de premissas (sobre mortalidade, sinistralidade, taxas de juros, inflação, etc.).
Na prática, o TAP consiste em projetar os fluxos de caixa futuros de todos os passivos (por exemplo, pagamentos de benefícios, indenizações de seguros, resgates, etc.) e então calcular o valor presente desses fluxos usando uma taxa de desconto apropriada (geralmente uma taxa de juros de longo prazo, livre de risco, ou aderente ao mercado). Esse resultado é então comparado com o montante de reservas técnicas que a empresa possui contabilizado.
Se o valor presente dos passivos projetados for maior do que as reservas (passivos) contabilizadas, significa que há um déficit na cobertura: as reservas são insuficientes. Nesse caso, o TAP determina que seja constituída uma provisão adicional para cobrir essa insuficiência:contentReference[oaicite:3]{index=3}. Essa provisão extra afeta o resultado do período (reduz o lucro ou gera prejuízo) e o patrimônio da empresa, mas é fundamental para refletir a realidade econômica de que os ativos atuais não cobrem plenamente as obrigações futuras.
Por outro lado, se o valor presente dos passivos estiver coberto pelas reservas (ou seja, houver superávit ou pelo menos equilíbrio), então os passivos são considerados adequados e não é necessária provisão extra. O TAP, portanto, funciona como um “teste de estresse” da solvência técnica da empresa em relação aos seus compromissos.
Esse teste foi inicialmente introduzido alinhado a práticas internacionais de contabilidade (IFRS 4 e, posteriormente, IFRS 17, no caso de contratos de seguro) e também é exigido pelos órgãos reguladores no Brasil (SUSEP, ANS, etc., dependendo do setor) para monitorar a saúde financeira das entidades sob sua supervisão. No contexto de previdência complementar aberta (planos PGBL/VGBL, seguros de vida, etc.), a SUSEP exige o TAP periodicamente. No caso da previdência fechada (fundos de pensão), existem exercícios similares de solvência conduzidos sob regulamentação da PREVIC.
Em suma, o TAP serve para garantir uma gestão prudencial: se as coisas mudarem (por exemplo, se a inflação disparar aumentando benefícios, ou se a tábua de longevidade indicar que as pessoas viverão mais e receberão por mais tempo), a empresa identifica rapidamente a insuficiência e toma medidas. As medidas para equilibrar novamente podem incluir aportes de capital pelos acionistas, ajustes de preços/contribuições em novos contratos, revisão de premissas, entre outras. Veremos no estudo de caso como um salto de inflação (IGP-M) ativou a necessidade de reforço de reservas em uma seguradora de previdência.
Quiz: TAP
Q7: O que verifica o Teste de Adequação de Passivos (TAP)?
Correto! O TAP calcula o valor presente dos passivos futuros e compara com as reservas existentes. Se as reservas (ativos) forem suficientes para cobrir os passivos projetados, os passivos são adequados; caso contrário, aponta insuficiência. Incorreto. O TAP não está relacionado diretamente ao resultado de um período, mas sim à suficiência de reservas para cobrir compromissos futuros. É possível uma empresa ter lucro e, mesmo assim, ter insuficiência de passivos (ou vice-versa). Incorreto. Essa comparação de juros vs inflação não é o foco do TAP. O TAP se concentra em ativos vs passivos, não diretamente em indicadores econômicos isolados. Incorreto. O pagamento de dividendos pode ser influenciado pelos resultados e pelo capital, mas o TAP foca na suficiência de reservas para passivos. Se o TAP indicar déficit, isso pode indiretamente limitar dividendos (pois precisará de capital), mas o teste em si não avalia dividendos.Q8: Caso o TAP indique que os passivos são superiores às reservas (ou seja, insuficiência), a empresa deve:
Correto! Diante de insuficiência, contabiliza-se uma provisão suplementar de passivos (um reforço nas reservas técnicas) equivalente ao déficit apurado. Isso corrige a situação nos balanços, ainda que reduza o lucro ou patrimônio. Incorreto. As normas contábeis exigem o reconhecimento imediato da insuficiência via provisão. Não é permitido “empurrar para frente” o déficit; ele deve aparecer nas demonstrações financeiras do período do teste. Incorreto. O TAP tem efeito real e regulatório. Ignorar o resultado seria violar normas. Se há insuficiência, medidas concretas (provisão extra, aporte de capital etc.) devem ser tomadas. Incorreto. Se há insuficiência, possivelmente a empresa não poderá distribuir lucros como antes, pois terá que cobrir o déficit (reduzindo o lucro disponível). De fato, empresas em déficit técnico tendem a reter resultados e até requerer capital extra.Q9: Qual destas empresas provavelmente precisa realizar TAP regularmente?
Correto! Seguradoras de vida e previdência precisam sim fazer o TAP regularmente, dado que possuem obrigações de longo prazo (indenizações, aposentadorias) e precisam garantir que suas reservas são suficientes. Incorreto. Bancos de investimento sem passivos atuariais relevantes não se enquadram no TAP. Bancos têm outros testes (como teste de estresse de liquidez, Basiléia etc.), mas TAP é mais pertinente a seguros/previdência. Incorreto. Empresas não financeiras geralmente não fazem TAP. Elas gerenciam suas dívidas e ativos, mas o TAP é específico para verificar reservas técnicas em setores regulados. Incorreto. Essa empresa não tem passivos atuariais nem reservas técnicas para monitorar. O TAP não se aplicaria nesse caso.Risco de Descasamento e Casamento de Ativos e Passivos
Chamamos de risco de descasamento a probabilidade de perdas causadas pela falta de alinhamento entre características dos ativos e dos passivos de uma instituição. Esses descasamentos podem ocorrer em diversos aspectos:
- Prazos (duration): quando os ativos vencem antes (ou muito depois) dos passivos. Ex.: captar recursos que vencem em 1 ano e emprestar por 5 anos expõe ao risco de não conseguir refinanciar depois de 1 ano sem custos elevados.
- Indexadores e taxas: quando os ativos rendem de acordo com um índice (por exemplo, taxa fixa ou IPCA) e os passivos estão atrelados a outro (por exemplo, IGP-M ou taxa flutuante). Nesses casos, uma mudança relativa nesses indexadores pode prejudicar a instituição.
- Moeda: quando há diferenças de moeda. Por exemplo, ter dívida em dólar mas receitas em reais gera risco cambial – se o dólar dispara, a dívida aumenta em reais sem contrapartida de ativo.
- Liquidez: quando os passivos podem exigir pagamento rápido (ex.: saques de clientes) mas os ativos estão imobilizados ou têm baixa liquidez, pode faltar caixa no momento necessário.
No contexto de ALM, o objetivo é mitigar esses riscos de descasamento realizando o casamento de ativos e passivos (matching). Isso significa escolher ativos cuja natureza “casa” com as obrigações da instituição. Por exemplo:
- Se a empresa tem uma dívida que terá pagamento único daqui a 10 anos, ela pode adquirir um título que vença em 10 anos de valor equivalente – assim, ao final do período, o ativo paga exatamente o passivo.
- Se um fundo de pensão tem benefícios atualizados pelo IPCA (inflação ao consumidor), ele buscará investir majoritariamente em ativos também atrelados ao IPCA (como títulos do Tesouro IPCA+), evitando ficar exposto a outro índice.
- Se uma seguradora de veículos tem expectativa de pagar sinistros mensalmente, ela deve manter ativos líquidos e de curto prazo para honrar esses pagamentos continuamente.
Na prática, atingir um casamento perfeito é difícil. O mercado pode não oferecer ativos exatamente com o perfil desejado. Um exemplo claro é o caso de títulos indexados ao IGP-M no Brasil. O governo deixou de emitir títulos públicos atrelados ao IGP-M (antigos NTN-C) já há muitos anos, o que gera escassez de ativos com esse indexador:contentReference[oaicite:4]{index=4}. Portanto, fundos de pensão ou seguradoras com passivos vinculados ao IGP-M enfrentam um desafio: como casar algo que não tem “par” ideal no mercado?
Nessas situações, as instituições precisam optar por estratégias alternativas para mitigar o risco de descasamento:
- Casamento parcial: Investir na combinação de ativos disponível que mais se aproxime dos passivos. No exemplo do IGP-M, muitas entidades optam por títulos atrelados ao IPCA (já que historicamente os dois índices de inflação têm alguma correlação, embora possam divergir bastante em certos períodos). Não é o casamento perfeito, mas é o mais próximo possível com os instrumentos disponíveis.
- Uso de derivativos: Utilizar contratos futuros, swaps ou outros derivativos para reduzir o risco (veremos mais no próximo tópico). Por exemplo, se não há ativo IGP-M suficiente, pode-se tentar um swap que pague IGP-M. Ou então, no caso de moeda, usar contratos de câmbio futuros para se proteger.
- Ajuste de produto/contrato: Em casos extremos, renegociar condições dos passivos ou encerrar produtos. Ex.: algumas seguradoras e fundos tentaram trocar o indexador de planos antigos de IGP-M+X% para índices mais viáveis (como IPCA+Y%), mediante concordância de participantes, devido à dificuldade de gestão do IGP-M:contentReference[oaicite:5]{index=5}. Essa solução depende de negociação e aspectos legais, mas ilustra uma saída para eliminar o descasamento na origem.
A importância de monitorar o descasamento fica evidente quando ocorrem choques econômicos. Um pequeno descasamento pode parecer gerenciável sob condições normais, mas um evento inesperado (como uma disparada de inflação, uma desvalorização cambial forte ou uma crise de crédito) pode ampliar muito o gap e gerar prejuízos expressivos. É por isso que, no ALM, muitas vezes trabalha-se com cenários de estresse: “E se a inflação X ficar muito acima da Y?”; “E se os juros subirem 5 pontos?” etc., para avaliar o impacto e planejar respostas.
Quiz: Descasamento e Matching
Q10: Qual dos seguintes é um exemplo de descasamento entre ativos e passivos?
Correto! Dívida em moeda estrangeira versus receita em moeda local é um descasamento de moeda. Se a taxa de câmbio variar (dólar subir), a dívida em reais aumenta sem que a receita acompanhe, gerando risco financeiro. Incorreto. Neste caso, não há descasamento, mas sim casamento de indexador (ativos e passivos atrelados ao mesmo índice). Isso é desejável, pois reduz risco. Incorreto. Se tanto captação quanto empréstimo são pós-fixados ao mesmo indexador (por exemplo, CDI), há casamento de taxas. O banco estará protegido de oscilações porque paga e recebe baseado no mesmo indicador. Incorreto. Isso refere-se a cálculos atuariais (como TAP), mas não descreve um descasamento. Um descasamento seria, por exemplo, a seguradora ter provisões atreladas à inflação e ativos que não acompanham essa inflação.Q11: Para reduzir o risco de descasamento de juros (taxa fixa vs pós-fixada), uma estratégia do ALM é:
Correto! Matching de duração é uma técnica básica de ALM para risco de juros. Se os fluxos dos ativos e passivos reagem de forma semelhante às variações de juros (ou seja, têm durations semelhantes), o impacto líquido de mudanças de taxa tende a ser pequeno. Incorreto. Ações trazem um outro tipo de risco (de mercado variável) e não garantem proteção contra descasamento de juros. Na verdade, isso poderia até aumentar o risco total. Incorreto. Caixa não rende juros, então embora não haja descasamento de taxa, a empresa perderia rentabilidade e possivelmente não conseguiria cumprir passivos de longo prazo apenas com caixa parado. Além disso, para passivos longos, caixa tem duration ~0, muito distante da duration do passivo. Incorreto. Ignorar indexadores e duração seria negligenciar o risco de descasamento. O ALM justamente foca nesses fatores para evitar surpresas negativas.Q12: Por que é difícil casar passivos atrelados ao IGP-M no mercado brasileiro?
Correto! O governo não emite mais títulos atrelados ao IGP-M (conhecidos como NTN-C). Sem esses títulos, faltam instrumentos de longo prazo que paguem exatamente IGP-M, o que dificulta o hedge perfeito para passivos vinculados a esse índice:contentReference[oaicite:6]{index=6}. Incorreto. O IGP-M continua a ser calculado mensalmente pela FGV e é amplamente utilizado (aluguéis, energia, etc.). O problema não é sua inexistência, mas a falta de ativos correlacionados a ele. Incorreto. IGP-M e IPCA são índices diferentes. Em alguns períodos têm comportamentos bem distintos (como 2020-2021). Supondo que “dá na mesma” seria um erro; quem apostou nisso se expôs ao descasamento. Incorreto. Não há proibição legal de se proteger; o problema é de mercado mesmo (falta de instrumentos). Se houvesse ativos ou derivativos líquidos de IGP-M, as empresas poderiam e iriam usá-los.Uso de Derivativos como Hedge no ALM (Swaps e Futuros)
Mesmo com todos os esforços de casar ativos e passivos diretamente, muitas vezes restam descasamentos. Os derivativos são então aliados poderosos para gestão de ALM, pois permitem “ajustar” exposições de forma flexível, sem precisar alterar completamente a carteira de ativos. Dois tipos comuns de derivativos usados em ALM são swaps e contratos futuros.
Swaps
Um swap é um contrato em que duas partes trocam fluxos de caixa futuros conforme fórmulas preestabelecidas. No contexto de ALM, swaps de juros ou de inflação são bastante úteis. Por exemplo, uma instituição pode fazer um swap CDI x IGP-M, onde ela paga CDI (taxa flutuante do interbancário diário) e recebe IGP-M + uma taxa fixa negociada. Para que isso? Imagine uma seguradora cujo passivo cresce por IGP-M. Seus ativos podem estar majoritariamente atrelados ao CDI. Ao entrar nesse swap, ela passa a ter um fluxo que acompanha o IGP-M (recebendo IGP-M) em troca de ceder parte do rendimento em CDI. Assim, se o IGP-M disparar, o swap vai pagar essa alta, compensando o passivo – efetivamente, torna-se um hedge (proteção) do indexador.
De forma similar, há swaps de taxa fixa x porcentagem do CDI (muito comuns), swaps de IPCA x CDI, swaps cambiais (troca de fluxo em real por dólar ou vice-versa), etc. A vantagem dos swaps é a personalização: pode-se calibrar notional (valor), prazo e fórmula conforme necessidade das partes. Porém, eles envolvem risco de contraparte: é preciso confiar que a outra parte (geralmente um banco) honrará os pagamentos. Por isso, swaps são contratados via instituições financeiras sólidas e, muitas vezes, exigem depósitos de garantias (colaterais) conforme as oscilações de valor do contrato.
Contratos Futuros
Futuros são derivativos padronizados negociados em bolsa (na B3, no caso brasileiro) que também permitem hedge de diversas variáveis. Um exemplo é o contrato futuro de DI (Depósito Interfinanceiro), que reflete a taxa de juros esperada para períodos futuros. Um gestor de ALM que deseje se proteger contra uma alta de juros pode vender contratos futuros de DI: se os juros subirem de fato, o preço desses futuros cairá e ele lucrará nessa posição, compensando a perda que terá nos títulos prefixados que possui. O contrário também vale – para se proteger de queda de juros quando se tem passivos prefixados, pode-se comprar futuros de DI.
No caso de inflação, a B3 já teve contratos futuros de IGP-M e IPCA no passado, mas atualmente a liquidez se concentra em swaps de inflação registrados (negociados via CETIP/B3) em vez de futuros. Ainda assim, existem índices de preços negociáveis: por exemplo, mercados de dívida privada ou títulos públicos indexados (como Tesouro IPCA+) servem indiretamente para proteger contra inflação. Para IGP-M, especificamente, as empresas muitas vezes recorrem a swaps personalizados com bancos, como mencionado.
Vale ressaltar que o hedge via derivativos, embora poderoso, pode ter custos. Swaps geralmente embutem um custo (o banco pode cobrar um spread para pagar IGP-M, por exemplo). Futuros exigem margens de garantia e ajustes diários de caixa (mark-to-market). Além disso, um hedge nunca é perfeito: pode haver risco de base, que é quando o instrumento de hedge não replica exatamente o comportamento do item protegido. Por exemplo, proteger IGP-M com IPCA gera base risk, pois apesar de relacionados, os índices podem divergir.
Em resumo, os derivativos ampliam as possibilidades de ALM: em vez de ficar restrito ao que existe no balanço, o gestor pode “sintetizar” exposições necessárias. Um caso prático simples: um fundo precisa urgentemente reduzir a duração de sua carteira (porque os passivos encurtaram, digamos). Vender todos os títulos longos poderia ser caro ou lento; em vez disso, ele pode vender contratos futuros de juros para reduzir a exposição efetiva rapidamente, e depois, com calma, ajustar a carteira física se precisar.
Quiz: Hedge com Derivativos
Q13: Qual dos instrumentos abaixo é um derivativo tipicamente usado para hedge de risco de juros?
Correto! O swap de juros (por exemplo, trocando taxa fixa por pós-fixada) é amplamente utilizado para gestão de risco de taxa. Permite transformar o perfil de fluxo de caixa de um ativo ou passivo. Incorreto. Ações não são derivativos e, embora possam ser usadas para compor carteira, não servem bem como hedge de risco de juros. Derivativos como swaps e futuros são mais indicados para isso. Incorreto. Um título prefixado é um ativo de renda fixa, não um derivativo. Ele tem risco de juros, ao invés de hedgear esse risco. Para hedge, usaríamos derivativos (swap, futuro) ligados a taxa de juros, não o próprio título prefixado. Incorreto. CDB é um ativo de renda fixa. Assim como o título público, é o objeto a ser gerenciado, não uma ferramenta de hedge derivativa. Derivativos são contratos cujo valor deriva de um ativo/índice subjacente (ex: swaps, futuros, opções).Q14: Em um swap onde uma empresa paga CDI e recebe IGP-M, o principal benefício para a empresa é:
Correto! Recebendo IGP-M no swap, a empresa ganha se o IGP-M subir, compensando o fato de seus passivos também terem aumentado. Ela paga CDI no swap, mas isso é gerenciável se seus ativos estão em CDI. Ou seja, converte parte do retorno CDI dos ativos em IGP-M, casando melhor com o passivo. Incorreto. Nesse swap ela está pagando CDI, ou seja, ficando “vendida” em CDI (exposta negativamente ao CDI). O objetivo do swap dado é focado no IGP-M, não em ganhar com CDI. Para ganhar com CDI alto, ela faria o oposto (receber CDI). Incorreto. Um swap CDI x IGP-M não lida diretamente com duration de fluxo de caixa temporal, mas sim com indexadores. Para reduzir duration, ela usaria swap de taxa fixa x pós, por exemplo. O foco do CDI x IGP-M é trocar indexador de inflação. Incorreto. O swap não elimina risco de crédito; na verdade, adiciona risco de crédito de contraparte (precisa confiar no banco do swap). Ele atua sobre risco de indexador/mercado (IGP-M, CDI), não sobre risco de crédito.Q15: Em relação a contratos futuros e swaps, assinale a afirmativa verdadeira:
Correto! Contratos futuros têm padronização (vencimento, lote, etc.) e são transacionados em bolsa com clearing. Swaps são típicos do mercado de balcão (OTC), customizados entre instituições financeiras e clientes, com flexibilidade de termos. Incorreto. É o contrário: futuros têm ajustes diários (marcação a mercado) e requerem margem de garantia. Swaps geralmente não têm ajuste diário de caixa, embora possam ter acordos de colateral periódicos. Incorreto. Ambos podem ser (e são) amplamente usados para hedge. O uso especulativo também é possível, mas não é a única finalidade. No ALM, o uso típico é hedge (proteção). Incorreto. Nos contratos futuros, a clearing house da bolsa atua como contraparte central e garante a liquidação (desde que se cumpram as margens). No swap OTC, o risco de contraparte é bilateral entre as partes contratantes, sem garantia de clearing – logo, há maior risco caso a contraparte quebre.Estudo de Caso: Brasilprev 2020–2024 (IGP-M vs IPCA)
Após cobrir os principais conceitos de ALM, vamos analisar um caso real onde esses temas foram colocados à prova. A Brasilprev, líder em previdência privada no Brasil, enfrentou entre 2020 e 2021 um desafio crítico de descasamento de indexadores nos seus planos tradicionais de benefício definido, exigindo medidas drásticas.
Contexto
Durante muitos anos, a Brasilprev ofereceu um plano tradicional com rentabilidade mínima garantida de IGP-M + 6% ao ano. Isso significava que os saldos dos participantes e seus benefícios eram reajustados por esse índice inflacionário (IGP-M) mais um juro real de 6% a.a. garantido contratualmente.
Contudo, a partir de 2020, o IGP-M disparou: enquanto o IPCA (inflação ao consumidor) ficou em torno de 4,5%, o IGP-M acumulou 23,14%. Em 2021, essa diferença se manteve: 17,8% de IGP-M contra 10,1% de IPCA. Isso gerou um enorme descasamento: os passivos (obrigações com clientes) cresciam acima de 20% ao ano, enquanto os ativos (títulos públicos e privados) rendiam entre 5% e 10%.
Após cobrir os principais conceitos de ALM, vamos analisar um caso real onde esses temas foram colocados à prova. A Brasilprev, líder em previdência privada no Brasil, enfrentou entre 2020 e 2021 um desafio de descasamento que exigiu medidas drásticas.
O contexto real: choque no IGP-M
A Brasilprev oferecia a milhares de clientes um plano de previdência tradicional com benefício garantido de IGP-M + 6% a.a.. Por muitos anos, isso foi gerenciável: o IGP-M se comportava de forma semelhante ao IPCA, e os ativos atrelados à inflação ou prefixados cobriam os compromissos. Mas isso mudou drasticamente a partir de 2020.
Enquanto o IPCA (índice oficial ao consumidor) encerrou 2020 com variação de 4,5%, o IGP-M acumulou incríveis 23,1%. Em 2021, a disparidade seguiu: 17,8% para o IGP-M contra 10,1% do IPCA. Isso levou os passivos da Brasilprev a crescerem de forma muito mais acelerada que seus ativos, que estavam majoritariamente atrelados ao IPCA ou prefixados.
Colocando-se na pele do gestor: o dilema da Brasilprev
Agora imagine que você é o gestor de risco da Brasilprev em dezembro de 2020. Você acabou de receber os dados atualizados do IGP-M e observa que o passivo total da empresa cresceu mais de 20% no ano, enquanto os ativos renderam bem menos. Os analistas atuariais estão em alerta: o Teste de Adequação de Passivos (TAP) indica necessidade urgente de reforço nas provisões técnicas. Se nada for feito, a empresa corre risco de descumprir exigências de solvência.
Você convoca uma reunião com as áreas de ALM, investimentos, compliance e diretoria. Na mesa, estão as seguintes opções:
- Opção A: Fazer um hedge parcial com derivativos atrelados ao IGP-M, como swaps. Mas o mercado é raso: há pouca liquidez para esse tipo de operação e os custos são elevados.
- Opção B: Solicitar um aporte de capital dos acionistas (Banco do Brasil e Principal Financial Group), o que reforçaria o capital mas exigiria sacrifícios – como suspensão de dividendos e desgaste político.
- Opção C: Fechar o plano tradicional para novos aportes, estancando o crescimento do passivo. Isso poderia evitar aumento do problema, mas geraria forte insatisfação de clientes e risco jurídico.
- Opção D: Tentar renegociar os contratos com os clientes, trocando IGP-M por IPCA ou CDI, com rentabilidade menor. Mas os clientes provavelmente não aceitariam: estão vendo ganhos de 30% ao ano no IGP-M e não abririam mão disso tão facilmente.
Como você agiria? Quais combinações dessas estratégias você adotaria para mitigar o impacto imediato e preservar a saúde financeira da empresa no médio prazo? Que tipo de comunicação faria com os órgãos reguladores e com os próprios clientes?
Mini Quiz de Decisão:
Se você fosse o CFO da Brasilprev no final de 2020, qual medida tomaria primeiro?
✔️ Medida sensata! Foi exatamente o que a empresa fez: buscou reforço de capital dos acionistas e suspendeu temporariamente dividendos para preservar solvência. ⚠️ Estratégia válida, mas com limitações práticas. Os swaps de IGP-M não cobrem o total necessário e são caros. A Brasilprev até tentou isso, mas como ação complementar. ✔️ Correto. Essa também foi uma medida adotada: suspenderam novos aportes ao plano tradicional para conter o crescimento dos passivos. Racional em termos de ALM. ❌ Não é viável no curto prazo. Renegociar contratos previdenciários exige autorização dos clientes e envolve longo processo legal.
Esse descompasso entre o índice de correção dos benefícios e a rentabilidade das aplicações fez com que a Brasilprev tivesse de aumentar suas provisões técnicas e recorrer a aportes de capital emergenciais em 2021 e 2022, que totalizaram R$ 1,8 bilhão. Além disso, a empresa suspendeu novos aportes nos planos tradicionais e buscou estratégias de hedge via derivativos, como swaps ligados ao IGP-M, embora com liquidez limitada no mercado.
A seguir, avalie os conhecimentos adquiridos respondendo às perguntas do quiz:
Q16: Qual era o índice de reajuste dos benefícios do plano Tradicional da Brasilprev que gerou o descasamento?
Incorreto. IPCA + 6% seria mais fácil de gerir, pois há mais instrumentos indexados ao IPCA. O problema foi o IGP-M. Correto! O plano garantia IGP-M + 6% ao ano. Quando o IGP-M disparou, os passivos cresceram demais. Incorreto. O CDI não era o indexador do plano tradicional. Incorreto. A Selic não era usada como indexador direto dos planos de previdência da Brasilprev.Q17: Que medida a Brasilprev tomou em 2021 para não agravar ainda mais o descasamento do plano IGP-M + 6%?
Correto! Para conter o crescimento dos passivos, a Brasilprev bloqueou novas contribuições no plano. Incorreto. Não é permitido mudar unilateralmente as regras contratuais de planos garantidos. Incorreto. O indexador contratado era o IGP-M. Não foi alterado. Incorreto. Migrações compulsórias não ocorreram. A adesão a outros planos foi voluntária.Q18: Quanto capital os acionistas da Brasilprev precisaram aportar entre 2020 e 2021?
Correto! A empresa recebeu R$ 1,2 bi em 2021 e mais R$ 750 mi em 2022, totalizando cerca de R$ 1,8 bi. Incorreto. O valor foi muito maior. 50 mi não seriam suficientes frente ao impacto do IGP-M. Incorreto. Houve sim aporte externo dos acionistas, além da retenção de lucros. Incorreto. O aporte necessário foi de ~R$ 1,8 bi, não 10 bilhões.Conclusão
Nesta aula, vimos como o Asset Liability Management (ALM) é fundamental para a saúde financeira de instituições que lidam com obrigações de longo prazo. Conceitos como duração, adequação de passivos e casamento de ativos/passivos podem soar teóricos, mas o estudo de caso da Brasilprev demonstrou de forma concreta seus impactos. Um descasamento significativo – seja de prazos ou indexadores – pode gerar perdas expressivas e demandar medidas emergenciais, enquanto uma boa gestão de ALM atua como amortecedor, equilibrando receitas e despesas mesmo em cenários adversos.
Recapitulando os principais aprendizados:
- ALM: busca alinhar ativos e passivos para minimizar riscos de mercado (juros, inflação, câmbio), garantindo que a instituição possa honrar seus compromissos a qualquer momento.
- Duração: ferramenta crucial para medir o risco de juros e calibrar a carteira. Matching de duração entre ativos e passivos é uma forma de imunização contra oscilações moderadas de taxa de juros.
- TAP: mecanismo de controle que alerta quando os passivos futuros não estão devidamente cobertos pelos ativos. Funciona como um “sinal de alerta” para necessidade de ajuste imediato (via provisões ou capital) e evita que problemas atuariais se agravem ocultamente.
- Descasamento vs Casamento: vimos que evitar descasamentos significativos é desejável, mas nem sempre trivial. Quando não é possível casar perfeitamente (por limitações do mercado ou legado de contratos), é preciso monitorar de perto e ter planos de contingência (capital, renegociação, etc.).
- Derivativos: Swaps e futuros servem como valiosas ferramentas de hedge, adicionando flexibilidade ao ALM. Eles permitem transferir/exchange riscos específicos (juros, inflação, câmbio) com outras partes, embora adicionem considerações de custo e contraparte.
- Case Brasilprev: evidenciou a importância de gestão prudente, preparação para cenários extremos e resposta ágil. Também mostrou a interdependência entre gestão de risco e necessidade de capital – no fim, um ALM inadequado consome capital dos sócios, enquanto um ALM eficiente protege o valor da empresa.
Em suma, o ALM combina ferramentas quantitativas (como duração, stress tests) com decisões estratégicas (como políticas de investimento e de produto) para garantir que, aconteça o que acontecer na economia, a instituição permaneça solvente e capaz de cumprir suas obrigações. Para você, futuro profissional do mercado financeiro, dominar esses conceitos significa estar apto a identificar e mitigar riscos sistêmicos e garantir sustentabilidade de longo prazo nas organizações em que atuar. Esperamos que este material tenha proporcionado insights valiosos sobre como teoria e prática andam juntas na gestão de ativos e passivos.
Quiz Final – Teste seu conhecimento
Teste agora, de forma abrangente, os conhecimentos adquiridos. Este quiz final contém 20 questões de múltipla escolha, cobrindo todos os tópicos abordados. Cada questão traz o feedback imediato após a seleção da resposta. Boa sorte!
Q19: “Casar” ativos e passivos significa:
Correto! Casar (match) ativos e passivos implica alinhar prazos, indexadores e valores para que ativos e obrigações se comportem de maneira sincronizada, minimizando volatilidade no resultado da empresa. Incorreto. Concentrar tudo em um único ativo pode aumentar risco, não diminuí-lo. Matching refere-se a compatibilizar com os passivos, e não a simplificar via concentração. Incorreto. Não se trata apenas de valor contábil, mas sim de comportamento financeiro. É possível ter valores iguais hoje e, se mal casados, divergir muito amanhã. O foco do ALM é na dinâmica futura e não somente no instantâneo presente. Incorreto. “Casar com o caixa” não é o significado aqui. Matching não significa ausência de risco, e sim gerir o risco. Uma carteira pode ter investimentos variáveis, desde que adequados aos passivos. Manter só caixa eliminaria risco de mercado, mas traria outros problemas (baixa rentabilidade).Q20: Se uma seguradora tem passivos de longo prazo atualizados pela inflação, o ativo a seguir que melhor mitigaria o descasamento seria:
Correto! Um título IPCA+ (NTN-B) paga inflação (IPCA) mais juros, oferecendo um fluxo que acompanha a inflação. Se os passivos também são atrelados à inflação, esses títulos casam bem, especialmente escolhendo vencimentos semelhantes ao horizonte dos passivos (match de duration). Incorreto. Ações tendem a ter correlação indireta com inflação, mas não protegem de forma específica passivos inflacionários de longo prazo. Elas introduzem risco de mercado acionário, que é diferente. Incorreto. Títulos atrelados ao CDI (taxa de juros) de curto prazo têm duration baixa e não necessariamente acompanham a inflação de longo prazo. Se a inflação variar, o CDI pode ou não compensar, e além disso haveria necessidade de reinvestir, trazendo risco de reinvestimento. Incorreto. Imóveis podem ter rendimentos ajustados por inflação (aluguéis geralmente são atrelados ao IGP-M), mas têm baixa liquidez e risco específico. Poderiam compor parte do hedge de inflação, mas não teriam a precisão e facilidade de ajuste que títulos públicos indexados fornecem.Q21: Qual das alternativas a seguir não é um objetivo do ALM?
Incorreto. Proteger contra variações de mercado que afetem diferentemente ativos e passivos é sim um objetivo fundamental do ALM. Incorreto. A gestão de liquidez (que ativos vencem antes ou na mesma época que os passivos) é parte importante do ALM. Evitar mismatch de liquidez é objetivo do ALM também. Correto! ALM não busca ganho especulativo em descasamentos – pelo contrário, procura minimizar o risco desses descasamentos. Se a empresa “aposta” em diferenças para lucrar, isso foge da prudência do ALM e vira estratégia especulativa (arriscada). Incorreto. Reduzir volatilidade do patrimônio (ou do resultado) é sim um objetivo do ALM – atingido ao alinhar ativos/passivos. Assim, choques afetam igualmente ambos os lados, neutralizando efeito líquido.Q22: Suponha que um fundo de pensão tenha duration média de seus passivos de 12 anos. Para imunizar parcialmente o risco de juros, seria recomendável que a duration da carteira de ativos estivesse:
Correto! Se a duration dos ativos for igual (ou próxima) à dos passivos, o fundo fica menos sensível a oscilações de juros. A ideia é justamente essa: durations pareadas para proteção (imunização). Incorreto. Se os ativos tiverem duration 1-2 anos e os passivos 12, há grande descasamento. Uma queda acentuada nos juros aumentaria muito o valor dos passivos (12 anos de duration) enquanto os ativos de 2 anos subiriam pouco. Portanto, risco maior, não menor. Incorreto. Duration dos ativos muito superior à dos passivos também gera descasamento (no sentido oposto). Por exemplo, se juros sobem, os ativos (20 anos) cairiam muito de valor, enquanto os passivos (12 anos) cairiam menos. Isso traria perda líquida. Incorreto. Duration é relevante sim – afeta diretamente a sensibilidade a juros. Ignorá-la seria má gestão. O alinhamento de duration é prática consagrada de segurança em ALM.Q23: Durante um TAP, identificou-se um “passivo a descoberto”. Isso significa que:
Correto! Passivo a descoberto é exatamente a situação em que, ao projetar os fluxos futuros e trazê-los a valor presente, as obrigações excedem os recursos disponíveis. É o gatilho para necessidade de ajustes (provisões complementares, aportes). Incorreto. “Passivo a descoberto” é o contrário: significa falta de cobertura para passivos existentes, não ausência de passivos. Ausência de passivos seria uma situação confortável, não um problema. Incorreto. Isso descreve superávit ou folga de passivos, o oposto de descoberto. Passivo a descoberto significa déficit, não sobra. Incorreto. Não é questão de erro contábil, mas sim de realidade econômica. O TAP revela que mesmo com cálculos corretos, os passivos são maiores que as provisões, apontando necessidade de medidas.Q24: Em cenários de estresse, como alta fora do comum de inflação ou juros, um ALM bem estruturado deve:
Correto! Esse é o objetivo: em choques, um ALM sólido faz com que as perdas de um lado sejam compensadas pelo outro. Por exemplo, se inflação sobe muito, os ativos também sobem (ou derivativos de hedge dão ganho) para compensar o aumento dos passivos. Incorreto. ALM não é voltado a gerar ganhos especulativos em crise, mas sim a proteger o patrimônio. Se estiver muito lucrando em um cenário de estresse, provavelmente assumiu posições assimétricas (ganhando de um lado sem perdas do outro), o que significa que em outro cenário oposto poderia perder muito. Logo, não é o foco. Incorreto. Embora crises possam causar perdas, o ALM visa limitar essas perdas. Instituições com ALM ineficaz sofrem muito mais (vide casos reais). Então, não é irrelevante – pelo contrário, faz diferença entre perda controlável e quebra. Incorreto. Se depender apenas de socorro, é porque o ALM falhou. O ALM bem feito busca evitar chegar ao ponto de precisar resgate. Claro que em casos extremos e raros isso pode acontecer, mas o ideal é não precisar ou minimizar essa dependência.Q25: Qual alternativa apresenta corretamente uma dificuldade de se fazer hedge perfeito do IGP-M no caso Brasilprev?
Correto! O mercado para IGP-M é pouco líquido: não há títulos públicos e derivativos disponíveis em volume para cobrir totalmente um passivo grande como aquele. Isso torna praticamente impossível o hedge perfeito – a empresa ficou com parte do risco descoberta. Incorreto. Não foi questão de vontade, mas sim de viabilidade. Mesmo que quisesse, a empresa possivelmente não encontraria quem tomasse o outro lado do IGP-M a um preço razoável, dado o tamanho da exposição e as condições de mercado. Incorreto. Não há proibição de hedge para inflação. Ao contrário, reguladores esperam que as empresas se protejam. A restrição foi de mercado mesmo, não regulatória. Incorreto. O IGP-M não caiu em 2020 – ele subiu muito, que foi o problema. E não surpreendeu por ser baixo, e sim por ser alto demais. Portanto, essa alternativa está incorreta quanto aos fatos.Q26: Uma das principais lições do caso Brasilprev para a gestão de risco é:
Correto! O chamado “evento de cauda” aconteceu – IGP-M explodiu. Instituições precisam considerar cenários extremos nas suas análises (stress tests) e ter planos de contingência. O inesperado acontece, e estar preparado diferencia empresas que sobrevivem das que não. Correto! Produtos criados em outra época com condições generosas podem sim se voltar contra as empresas quando o cenário muda. A lição é ter cuidado ao precificar produtos de longo prazo e monitorar constantemente sua sustentabilidade, talvez buscando migrar ou ajustar quando possível. Incorreto. No caso, quem socorreu foram os acionistas. Não houve interferência do Banco Central (nem caberia, pois não era banco). Esperar socorro oficial não é estratégia de gestão de risco – é falhar no ALM e contar com a sorte/piedade externa, o que não é garantido. Incorreto. Derivativos são úteis, mas não onipotentes. No caso, eles não evitaram a necessidade de aporte. Há cenários em que a cobertura não é total por limitações práticas (limite de mercado, custo, etc.). Portanto, derivativos são parte da solução, mas não garantem blindagem absoluta em qualquer circunstância.Q27: Qual órgão regula e supervisiona empresas de previdência aberta, como a Brasilprev, no tocante a solvência e práticas atuariais?
Correto! A SUSEP é responsável por fiscalizar seguradoras e entidades de previdência complementar aberta. Ela exige, por exemplo, a realização de TAP e manutenção de capital mínimo. (A previdência fechada, de fundos de pensão, é regulada pela PREVIC). Incorreto. O Banco Central regula instituições financeiras bancárias, não seguradoras/previdência complementar aberta. Para essas, o órgão é a SUSEP (no caso de Brasilprev, por ser previdência aberta). O Bacen teria envolvimento indireto via conglomerado BB, mas não regula diretamente a Brasilprev. Incorreto. A CVM regula o mercado de capitais (fundos de investimento, empresas abertas emitindo ações etc.). Planos de previdência e seguros não são regulados pela CVM, mas sim pela SUSEP. Incorreto. A B3 é a bolsa de valores/mercadorias, não um órgão regulador de seguradoras. Ela provê mercado para derivativos e títulos, mas não supervisiona companhias de seguros.Q28: O que é risco de base (basis risk) em hedge?
Correto! Risco de base ocorre quando há diferença entre o ativo objeto e o instrumento de hedge. Por exemplo, proteger IGP-M usando IPCA tem risco de base: se um divergir do outro, o hedge não cobre 100%. No geral, qualquer hedge com ativo substituto (não idêntico) tem esse risco residual. Incorreto. “Base” aqui não se refere à base monetária. É “base” no sentido de base do hedge, o ativo subjacente vs ativo alvo. Não confundir com política monetária. Incorreto. Perder margem depositada estaria ligado a movimento adverso de mercado que consumiu o valor, mas o termo “risco de base” tem definição específica ligada a correlação imperfeita no hedge, não à perda de margem per se. Incorreto. Trata-se de um trocadilho fora de contexto. Risco de base não tem a ver com base de clientes, e sim com base do hedge.Q29: No ALM de um banco, uma preocupação constante é:
Correto! Bancos captam a várias maturidades (muitas vezes curto prazo) e emprestam a clientes em prazos maiores. Gerir esse gap – garantir liquidez para pagar os depositantes e evitar que variação de juros entre curto e longo cause perdas – é essência do ALM bancário. Incorreto. Bancos oferecem produtos diversos (prefixados, pós, indexados). A questão não é ter tudo igual, mas equilibrar com passivos correspondentes ou derivativos para hedge. Incorreto. A atividade do banco é emprestar; evitar emprestar inviabiliza o negócio. O ALM visa fazer isso de forma equilibrada, não evitar a operação principal.Referências
- Almeida, Marília. “Brasilprev suspende aportes adicionais em plano antigo de previdência“. Exame, 28 jul. 2021.
- Tauhata, Sérgio. “BB Seguridade aprova reforço de capital de até R$ 1,2 bilhão para Brasilprev“. Valor Econômico, 04 jan. 2021.
- Cheng, Diana. “Apesar da resiliência, BB Seguridade tem desafios de médio e longo prazos para enfrentar“. Money Times, 09 fev. 2021.
- Saint Paul Escola de Negócios. “Como usar a ALM para potencializar resultados em finanças“. Blog Saint Paul, acesso em 12 abr. 2025.
- Yubb. “Duration de Macaulay: o que é e como calcular?“. Artigo online, 15 jan. 2021.
- Assistants Consultoria Atuarial. “TAP – Teste de Adequação de Passivos“. Blog Assistants, 16 jul. 2023.
