Fundamentos de ALM (Asset Liability Management)

Fundamentos de Asset Liability Management (ALM)

Introdução

Bem-vindo ao FinDynamics sobre Asset Liability Management (ALM), ou Gestão Ativo-Passivo. Nesta oportunidade, exploraremos como instituições financeiras e investidores gerenciam em conjunto seus ativos e passivos para garantir equilíbrio financeiro de longo prazo. Abordaremos conceitos-chave como duration (duração), adequação de passivos, riscos de descasamento e estratégias de hedge com derivativos, sempre com uma linguagem acessível e exemplos práticos.

O objetivo é que, ao final deste material interativo, você seja capaz de entender a importância do ALM e como aplicá-lo na prática, especialmente em contextos de previdência e seguros. Além disso, traremos um estudo de caso real da Brasilprev (2020-2024) para ilustrar os desafios de ALM diante de mudanças econômicas abruptas.

Objetivos de aprendizagem:

  • Compreender o conceito de ALM e sua importância na gestão de riscos.
  • Entender o que é duração e como o matching de duration de ativos e passivos pode reduzir risco de juros.
  • Aprender sobre o Teste de Adequação de Passivos (TAP) e por que ele é importante para seguradoras e fundos de pensão.
  • Identificar riscos de descasamento entre ativos e passivos e estratégias de casamento para mitigar esses riscos.
  • Conhecer o uso de derivativos (swaps, contratos futuros) como instrumentos de hedge no ALM.
  • Analisar o caso Brasilprev (2020-2024) para ver o ALM em um cenário real e desafiador.
ALM: Conceitos Básicos e Importância

ALM (Asset Liability Management) refere-se à gestão coordenada de ativos e passivos de uma instituição, visando equilibrar prazos, fluxos de caixa e indexadores de modo a minimizar riscos financeiros. Em outras palavras, é uma técnica de gerenciamento de risco que busca evitar o descasamento entre ativos e passivos​:contentReference[oaicite:0]{index=0}. Ao equilibrar essas duas pontas, a empresa melhora sua estabilidade financeira, garantindo maior segurança e rentabilidade sustentável.

Para entender melhor, lembre que ativos são os investimentos e recursos que geram fluxos de caixa futuros (por exemplo, títulos, ações, imóveis, caixa etc.), enquanto passivos são as obrigações e dívidas a pagar em determinados prazos (como empréstimos tomados, reservas técnicas para pagamentos de benefícios, provisões, etc.). O ALM analisa as características desses ativos e passivos – como prazo de vencimento, taxa de juros, indexadores (inflação, câmbio), liquidez – e busca estratégias para alinhá-los.

Em um banco, por exemplo, o ALM envolve administrar a diferença entre prazos de captação (depósitos dos clientes, normalmente de curto prazo) e de empréstimos concedidos (créditos de longo prazo). Já em um fundo de pensão ou seguradora, o ALM é crucial para garantir que os investimentos (ativos) sejam suficientes para pagar benefícios futuros (passivos) nas datas e termos prometidos.

Quando o ALM é bem executado, a instituição consegue se proteger melhor de mudanças econômicas. Por exemplo, se os juros subirem ou caírem, ou se a inflação variar além do esperado, um bom casamento entre ativos e passivos fará com que o impacto seja mínimo sobre o resultado, pois ganhos e perdas se compensam em ambos os lados.

Por outro lado, uma gestão inadequada do ALM pode trazer consequências graves. Se os ativos não forem suficientes ou adequados para cobrir os passivos, a instituição pode enfrentar déficits, necessidade de aportes emergenciais de capital ou até insolvência no longo prazo. Veremos adiante um caso real onde um descasamento significativo causou prejuízos e necessidade de intervenção dos acionistas.

Quiz: Conceitos de ALM

Q1: Qual é o principal objetivo do Asset Liability Management (ALM)?

Q2: Em qual das situações abaixo o ALM é mais importante?

Q3: O descasamento entre ativos e passivos pode resultar em:

Duration: Medindo o Risco de Juros

Um conceito fundamental no ALM é a duration (duração). A duração de um ativo financeiro de renda fixa, como um título ou uma carteira de títulos, representa o prazo médio em que são recebidos seus fluxos de caixa (cupons e principal), ponderados pelo valor presente. Em termos simples, é uma medida expressa em anos que indica quanto tempo, em média, o investidor leva para reaver seu investimento. Esse conceito é muito útil pois também serve como aproximação da sensibilidade do preço de um título a mudanças na taxa de juros: quanto maior a duração, mais o preço do título varia para uma dada mudança nos juros.

Algumas características importantes da duração:

  • Um título sem pagamentos intermediários (zero-cupom) possui duração igual ao seu prazo de vencimento. Ex: um título que vence em 5 anos e não paga cupons tem duration = 5 anos.
  • Um título com cupons periódicos terá duração menor que o seu prazo final, pois parte do dinheiro é recebida antes do vencimento. Quanto maiores ou mais rápidos os cupons, menor a duração. Ex: um título de 5 anos com cupons semestrais terá duração menor que 5 anos, porque o investidor recupera uma parte do valor a cada semestre.
  • Um título pós-fixado diário (por exemplo, Tesouro Selic ou LFT, atrelado à taxa diária DI/Selic) tem duration muito baixa, próxima a zero, pois sua rentabilidade se ajusta diariamente – o investidor não fica exposto a oscilações de taxa ao longo do tempo.

Por que a duração é tão relevante no ALM? Porque ela permite casar o risco de juros dos ativos com o dos passivos. Se um passivo (por exemplo, o compromisso de pagar uma renda em datas futuras) tem duração de 7 anos, isso significa que sua sensibilidade a mudanças na taxa de desconto é equivalente a um título de 7 anos. Para protegê-lo de oscilações de juros, o gestor pode montar a carteira de ativos com duração aproximada de 7 anos. Assim, se os juros subirem ou caírem, o valor presente dos ativos e dos passivos irá mudar em magnitude semelhante, mantendo o equilíbrio.

Em termos práticos, a duração nos dá uma aproximação: Variação de preço ≈ - (duração) × (variação da taxa de juros) (para pequenas mudanças em taxas). Por exemplo, se um título tem duração de 5 anos, uma alta de 1 ponto percentual na taxa de juros resultaria em uma queda de aproximadamente 5% no preço desse título. Da mesma forma, para um passivo de duração 5, seu valor presente cairia cerca de 5% com +1 pp na taxa (ou subiria ~5% se a taxa caísse 1 pp).

O gestor de ALM busca então reduzir o gap de duration (diferença entre a duração média dos ativos e a dos passivos). Quanto menor esse gap, menos sensível o patrimônio líquido da instituição fica a mudanças nas taxas de juros. Essa técnica é conhecida como imunização de carteira: alinhar a duração dos ativos à dos passivos para “imunizar” a entidade contra variações moderadas de juros.

É importante notar que a imunização por duração funciona bem para mudanças pequenas e paralelas na curva de juros. Movimentos muito bruscos ou alterações na forma da curva (mudança diferente em juros curtos vs. longos) podem exigir ajustes adicionais (por exemplo, levar em conta a convexidade ou usar derivativos para hedge mais fino).

Exemplo Numérico Simplificado

Considere dois títulos, ambos com valor de face de R$1000, sem risco de crédito, em um cenário de taxa de juros constante de 10% ao ano, para simplificar:

  • Título A: Zero-cupom que vence em 2 anos, pagando R$1000 no final.
  • Título B: Cupom anual de R$100 (10% do valor de face) e pagamento de R$1000 no final do 2º ano.

A duração do Título A é exatamente 2 anos, pois ele só paga no final. Já o Título B paga uma parte no ano 1 e o restante no ano 2. Se calcularmos sua duração (ponderando os tempos pelos valores presentes recebidos), encontraremos que é menor que 2 anos. Intuitivamente, isso ocorre porque recebemos R$ 100 já no primeiro ano, reduzindo o tempo médio de recebimento. De fato, se descontarmos os fluxos do Título B a 10% ao ano:

  • Valor presente do fluxo no ano 1: 100 / (1 + 0,10) = R$ 90,91
  • Valor presente do fluxo no ano 2 (R$ 1100, incluindo principal + cupom): 1100 / (1 + 0,10)2 = R$ 909,91
  • Valor presente total ≈ R$ 1000 (como esperado para um título justo a 10%)
  • Duração ≈ (1 × 90,91 + 2 × 909,91) / 1000 = (90,91 + 1819,82) / 1000 = 1,91 anos

Ou seja, o Título B tem duração aproximada de 1,91 anos, menor que os 2 anos do Título A. Esse exemplo ilustra que pagamentos antecipados reduzem a duração. Para o gestor de ALM, importar-se com essas diferenças significa que, se seus passivos vencem em cerca de 2 anos, talvez seja preferível investir no Título B do que no Título A, pois o B tem duração mais próxima da dos passivos (especialmente se os passivos também tiverem alguns pagamentos intermediários).

Quiz: Duration

Q4: A duration de um título de renda fixa mede:

Q5: Se a duration de um título é 5 e a taxa de juros sobe 1% (de forma inesperada), o preço do título:

Q6: Comparando os títulos abaixo, qual terá a maior duração?

TAP: Teste de Adequação de Passivos

O Teste de Adequação de Passivos (TAP) é um procedimento contábil-atuarial utilizado por seguradoras, entidades de previdência e outras empresas com obrigações de longo prazo para verificar se os passivos estimados estão adequadamente cobertos pelos ativos e reservas disponíveis​:contentReference[oaicite:2]{index=2}. Em outras palavras, o TAP avalia se a empresa tem recursos suficientes para honrar todos os seus compromissos futuros, dado um conjunto de premissas (sobre mortalidade, sinistralidade, taxas de juros, inflação, etc.).

Na prática, o TAP consiste em projetar os fluxos de caixa futuros de todos os passivos (por exemplo, pagamentos de benefícios, indenizações de seguros, resgates, etc.) e então calcular o valor presente desses fluxos usando uma taxa de desconto apropriada (geralmente uma taxa de juros de longo prazo, livre de risco, ou aderente ao mercado). Esse resultado é então comparado com o montante de reservas técnicas que a empresa possui contabilizado.

Se o valor presente dos passivos projetados for maior do que as reservas (passivos) contabilizadas, significa que há um déficit na cobertura: as reservas são insuficientes. Nesse caso, o TAP determina que seja constituída uma provisão adicional para cobrir essa insuficiência​:contentReference[oaicite:3]{index=3}. Essa provisão extra afeta o resultado do período (reduz o lucro ou gera prejuízo) e o patrimônio da empresa, mas é fundamental para refletir a realidade econômica de que os ativos atuais não cobrem plenamente as obrigações futuras.

Por outro lado, se o valor presente dos passivos estiver coberto pelas reservas (ou seja, houver superávit ou pelo menos equilíbrio), então os passivos são considerados adequados e não é necessária provisão extra. O TAP, portanto, funciona como um "teste de estresse" da solvência técnica da empresa em relação aos seus compromissos.

Esse teste foi inicialmente introduzido alinhado a práticas internacionais de contabilidade (IFRS 4 e, posteriormente, IFRS 17, no caso de contratos de seguro) e também é exigido pelos órgãos reguladores no Brasil (SUSEP, ANS, etc., dependendo do setor) para monitorar a saúde financeira das entidades sob sua supervisão. No contexto de previdência complementar aberta (planos PGBL/VGBL, seguros de vida, etc.), a SUSEP exige o TAP periodicamente. No caso da previdência fechada (fundos de pensão), existem exercícios similares de solvência conduzidos sob regulamentação da PREVIC.

Em suma, o TAP serve para garantir uma gestão prudencial: se as coisas mudarem (por exemplo, se a inflação disparar aumentando benefícios, ou se a tábua de longevidade indicar que as pessoas viverão mais e receberão por mais tempo), a empresa identifica rapidamente a insuficiência e toma medidas. As medidas para equilibrar novamente podem incluir aportes de capital pelos acionistas, ajustes de preços/contribuições em novos contratos, revisão de premissas, entre outras. Veremos no estudo de caso como um salto de inflação (IGP-M) ativou a necessidade de reforço de reservas em uma seguradora de previdência.

Quiz: TAP

Q7: O que verifica o Teste de Adequação de Passivos (TAP)?

Q8: Caso o TAP indique que os passivos são superiores às reservas (ou seja, insuficiência), a empresa deve:

Q9: Qual destas empresas provavelmente precisa realizar TAP regularmente?

Risco de Descasamento e Casamento de Ativos e Passivos

Chamamos de risco de descasamento a probabilidade de perdas causadas pela falta de alinhamento entre características dos ativos e dos passivos de uma instituição. Esses descasamentos podem ocorrer em diversos aspectos:

  • Prazos (duration): quando os ativos vencem antes (ou muito depois) dos passivos. Ex.: captar recursos que vencem em 1 ano e emprestar por 5 anos expõe ao risco de não conseguir refinanciar depois de 1 ano sem custos elevados.
  • Indexadores e taxas: quando os ativos rendem de acordo com um índice (por exemplo, taxa fixa ou IPCA) e os passivos estão atrelados a outro (por exemplo, IGP-M ou taxa flutuante). Nesses casos, uma mudança relativa nesses indexadores pode prejudicar a instituição.
  • Moeda: quando há diferenças de moeda. Por exemplo, ter dívida em dólar mas receitas em reais gera risco cambial – se o dólar dispara, a dívida aumenta em reais sem contrapartida de ativo.
  • Liquidez: quando os passivos podem exigir pagamento rápido (ex.: saques de clientes) mas os ativos estão imobilizados ou têm baixa liquidez, pode faltar caixa no momento necessário.

No contexto de ALM, o objetivo é mitigar esses riscos de descasamento realizando o casamento de ativos e passivos (matching). Isso significa escolher ativos cuja natureza “casa” com as obrigações da instituição. Por exemplo:

  • Se a empresa tem uma dívida que terá pagamento único daqui a 10 anos, ela pode adquirir um título que vença em 10 anos de valor equivalente – assim, ao final do período, o ativo paga exatamente o passivo.
  • Se um fundo de pensão tem benefícios atualizados pelo IPCA (inflação ao consumidor), ele buscará investir majoritariamente em ativos também atrelados ao IPCA (como títulos do Tesouro IPCA+), evitando ficar exposto a outro índice.
  • Se uma seguradora de veículos tem expectativa de pagar sinistros mensalmente, ela deve manter ativos líquidos e de curto prazo para honrar esses pagamentos continuamente.

Na prática, atingir um casamento perfeito é difícil. O mercado pode não oferecer ativos exatamente com o perfil desejado. Um exemplo claro é o caso de títulos indexados ao IGP-M no Brasil. O governo deixou de emitir títulos públicos atrelados ao IGP-M (antigos NTN-C) já há muitos anos, o que gera escassez de ativos com esse indexador​:contentReference[oaicite:4]{index=4}. Portanto, fundos de pensão ou seguradoras com passivos vinculados ao IGP-M enfrentam um desafio: como casar algo que não tem “par” ideal no mercado?

Nessas situações, as instituições precisam optar por estratégias alternativas para mitigar o risco de descasamento:

  • Casamento parcial: Investir na combinação de ativos disponível que mais se aproxime dos passivos. No exemplo do IGP-M, muitas entidades optam por títulos atrelados ao IPCA (já que historicamente os dois índices de inflação têm alguma correlação, embora possam divergir bastante em certos períodos). Não é o casamento perfeito, mas é o mais próximo possível com os instrumentos disponíveis.
  • Uso de derivativos: Utilizar contratos futuros, swaps ou outros derivativos para reduzir o risco (veremos mais no próximo tópico). Por exemplo, se não há ativo IGP-M suficiente, pode-se tentar um swap que pague IGP-M. Ou então, no caso de moeda, usar contratos de câmbio futuros para se proteger.
  • Ajuste de produto/contrato: Em casos extremos, renegociar condições dos passivos ou encerrar produtos. Ex.: algumas seguradoras e fundos tentaram trocar o indexador de planos antigos de IGP-M+X% para índices mais viáveis (como IPCA+Y%), mediante concordância de participantes, devido à dificuldade de gestão do IGP-M​:contentReference[oaicite:5]{index=5}. Essa solução depende de negociação e aspectos legais, mas ilustra uma saída para eliminar o descasamento na origem.

A importância de monitorar o descasamento fica evidente quando ocorrem choques econômicos. Um pequeno descasamento pode parecer gerenciável sob condições normais, mas um evento inesperado (como uma disparada de inflação, uma desvalorização cambial forte ou uma crise de crédito) pode ampliar muito o gap e gerar prejuízos expressivos. É por isso que, no ALM, muitas vezes trabalha-se com cenários de estresse: “E se a inflação X ficar muito acima da Y?”; “E se os juros subirem 5 pontos?” etc., para avaliar o impacto e planejar respostas.

Quiz: Descasamento e Matching

Q10: Qual dos seguintes é um exemplo de descasamento entre ativos e passivos?

Q11: Para reduzir o risco de descasamento de juros (taxa fixa vs pós-fixada), uma estratégia do ALM é:

Q12: Por que é difícil casar passivos atrelados ao IGP-M no mercado brasileiro?

Uso de Derivativos como Hedge no ALM (Swaps e Futuros)

Mesmo com todos os esforços de casar ativos e passivos diretamente, muitas vezes restam descasamentos. Os derivativos são então aliados poderosos para gestão de ALM, pois permitem "ajustar" exposições de forma flexível, sem precisar alterar completamente a carteira de ativos. Dois tipos comuns de derivativos usados em ALM são swaps e contratos futuros.

Swaps

Um swap é um contrato em que duas partes trocam fluxos de caixa futuros conforme fórmulas preestabelecidas. No contexto de ALM, swaps de juros ou de inflação são bastante úteis. Por exemplo, uma instituição pode fazer um swap CDI x IGP-M, onde ela paga CDI (taxa flutuante do interbancário diário) e recebe IGP-M + uma taxa fixa negociada. Para que isso? Imagine uma seguradora cujo passivo cresce por IGP-M. Seus ativos podem estar majoritariamente atrelados ao CDI. Ao entrar nesse swap, ela passa a ter um fluxo que acompanha o IGP-M (recebendo IGP-M) em troca de ceder parte do rendimento em CDI. Assim, se o IGP-M disparar, o swap vai pagar essa alta, compensando o passivo – efetivamente, torna-se um hedge (proteção) do indexador.

De forma similar, há swaps de taxa fixa x porcentagem do CDI (muito comuns), swaps de IPCA x CDI, swaps cambiais (troca de fluxo em real por dólar ou vice-versa), etc. A vantagem dos swaps é a personalização: pode-se calibrar notional (valor), prazo e fórmula conforme necessidade das partes. Porém, eles envolvem risco de contraparte: é preciso confiar que a outra parte (geralmente um banco) honrará os pagamentos. Por isso, swaps são contratados via instituições financeiras sólidas e, muitas vezes, exigem depósitos de garantias (colaterais) conforme as oscilações de valor do contrato.

Contratos Futuros

Futuros são derivativos padronizados negociados em bolsa (na B3, no caso brasileiro) que também permitem hedge de diversas variáveis. Um exemplo é o contrato futuro de DI (Depósito Interfinanceiro), que reflete a taxa de juros esperada para períodos futuros. Um gestor de ALM que deseje se proteger contra uma alta de juros pode vender contratos futuros de DI: se os juros subirem de fato, o preço desses futuros cairá e ele lucrará nessa posição, compensando a perda que terá nos títulos prefixados que possui. O contrário também vale – para se proteger de queda de juros quando se tem passivos prefixados, pode-se comprar futuros de DI.

No caso de inflação, a B3 já teve contratos futuros de IGP-M e IPCA no passado, mas atualmente a liquidez se concentra em swaps de inflação registrados (negociados via CETIP/B3) em vez de futuros. Ainda assim, existem índices de preços negociáveis: por exemplo, mercados de dívida privada ou títulos públicos indexados (como Tesouro IPCA+) servem indiretamente para proteger contra inflação. Para IGP-M, especificamente, as empresas muitas vezes recorrem a swaps personalizados com bancos, como mencionado.

Vale ressaltar que o hedge via derivativos, embora poderoso, pode ter custos. Swaps geralmente embutem um custo (o banco pode cobrar um spread para pagar IGP-M, por exemplo). Futuros exigem margens de garantia e ajustes diários de caixa (mark-to-market). Além disso, um hedge nunca é perfeito: pode haver risco de base, que é quando o instrumento de hedge não replica exatamente o comportamento do item protegido. Por exemplo, proteger IGP-M com IPCA gera base risk, pois apesar de relacionados, os índices podem divergir.

Em resumo, os derivativos ampliam as possibilidades de ALM: em vez de ficar restrito ao que existe no balanço, o gestor pode "sintetizar" exposições necessárias. Um caso prático simples: um fundo precisa urgentemente reduzir a duração de sua carteira (porque os passivos encurtaram, digamos). Vender todos os títulos longos poderia ser caro ou lento; em vez disso, ele pode vender contratos futuros de juros para reduzir a exposição efetiva rapidamente, e depois, com calma, ajustar a carteira física se precisar.

Quiz: Hedge com Derivativos

Q13: Qual dos instrumentos abaixo é um derivativo tipicamente usado para hedge de risco de juros?

Q14: Em um swap onde uma empresa paga CDI e recebe IGP-M, o principal benefício para a empresa é:

Q15: Em relação a contratos futuros e swaps, assinale a afirmativa verdadeira:

Estudo de Caso: Brasilprev 2020–2024 (IGP-M vs IPCA)

Após cobrir os principais conceitos de ALM, vamos analisar um caso real onde esses temas foram colocados à prova. A Brasilprev, líder em previdência privada no Brasil, enfrentou entre 2020 e 2021 um desafio crítico de descasamento de indexadores nos seus planos tradicionais de benefício definido, exigindo medidas drásticas.

Contexto

Durante muitos anos, a Brasilprev ofereceu um plano tradicional com rentabilidade mínima garantida de IGP-M + 6% ao ano. Isso significava que os saldos dos participantes e seus benefícios eram reajustados por esse índice inflacionário (IGP-M) mais um juro real de 6% a.a. garantido contratualmente.

Contudo, a partir de 2020, o IGP-M disparou: enquanto o IPCA (inflação ao consumidor) ficou em torno de 4,5%, o IGP-M acumulou 23,14%. Em 2021, essa diferença se manteve: 17,8% de IGP-M contra 10,1% de IPCA. Isso gerou um enorme descasamento: os passivos (obrigações com clientes) cresciam acima de 20% ao ano, enquanto os ativos (títulos públicos e privados) rendiam entre 5% e 10%.

Após cobrir os principais conceitos de ALM, vamos analisar um caso real onde esses temas foram colocados à prova. A Brasilprev, líder em previdência privada no Brasil, enfrentou entre 2020 e 2021 um desafio de descasamento que exigiu medidas drásticas.

O contexto real: choque no IGP-M

A Brasilprev oferecia a milhares de clientes um plano de previdência tradicional com benefício garantido de IGP-M + 6% a.a.. Por muitos anos, isso foi gerenciável: o IGP-M se comportava de forma semelhante ao IPCA, e os ativos atrelados à inflação ou prefixados cobriam os compromissos. Mas isso mudou drasticamente a partir de 2020.

Gráfico IGP-M vs IPCA
Gráfico 1: Inflação acumulada anual – IGP-M vs IPCA (2019–2023). A disparidade em 2020 e 2021 explica a origem do descasamento enfrentado pela Brasilprev.

Enquanto o IPCA (índice oficial ao consumidor) encerrou 2020 com variação de 4,5%, o IGP-M acumulou incríveis 23,1%. Em 2021, a disparidade seguiu: 17,8% para o IGP-M contra 10,1% do IPCA. Isso levou os passivos da Brasilprev a crescerem de forma muito mais acelerada que seus ativos, que estavam majoritariamente atrelados ao IPCA ou prefixados.

Colocando-se na pele do gestor: o dilema da Brasilprev

Agora imagine que você é o gestor de risco da Brasilprev em dezembro de 2020. Você acabou de receber os dados atualizados do IGP-M e observa que o passivo total da empresa cresceu mais de 20% no ano, enquanto os ativos renderam bem menos. Os analistas atuariais estão em alerta: o Teste de Adequação de Passivos (TAP) indica necessidade urgente de reforço nas provisões técnicas. Se nada for feito, a empresa corre risco de descumprir exigências de solvência.

Você convoca uma reunião com as áreas de ALM, investimentos, compliance e diretoria. Na mesa, estão as seguintes opções:

  • Opção A: Fazer um hedge parcial com derivativos atrelados ao IGP-M, como swaps. Mas o mercado é raso: há pouca liquidez para esse tipo de operação e os custos são elevados.
  • Opção B: Solicitar um aporte de capital dos acionistas (Banco do Brasil e Principal Financial Group), o que reforçaria o capital mas exigiria sacrifícios – como suspensão de dividendos e desgaste político.
  • Opção C: Fechar o plano tradicional para novos aportes, estancando o crescimento do passivo. Isso poderia evitar aumento do problema, mas geraria forte insatisfação de clientes e risco jurídico.
  • Opção D: Tentar renegociar os contratos com os clientes, trocando IGP-M por IPCA ou CDI, com rentabilidade menor. Mas os clientes provavelmente não aceitariam: estão vendo ganhos de 30% ao ano no IGP-M e não abririam mão disso tão facilmente.

Como você agiria? Quais combinações dessas estratégias você adotaria para mitigar o impacto imediato e preservar a saúde financeira da empresa no médio prazo? Que tipo de comunicação faria com os órgãos reguladores e com os próprios clientes?

Mini Quiz de Decisão:

Se você fosse o CFO da Brasilprev no final de 2020, qual medida tomaria primeiro?





Esse descompasso entre o índice de correção dos benefícios e a rentabilidade das aplicações fez com que a Brasilprev tivesse de aumentar suas provisões técnicas e recorrer a aportes de capital emergenciais em 2021 e 2022, que totalizaram R$ 1,8 bilhão. Além disso, a empresa suspendeu novos aportes nos planos tradicionais e buscou estratégias de hedge via derivativos, como swaps ligados ao IGP-M, embora com liquidez limitada no mercado.

A seguir, avalie os conhecimentos adquiridos respondendo às perguntas do quiz:

Q16: Qual era o índice de reajuste dos benefícios do plano Tradicional da Brasilprev que gerou o descasamento?

Q17: Que medida a Brasilprev tomou em 2021 para não agravar ainda mais o descasamento do plano IGP-M + 6%?

Q18: Quanto capital os acionistas da Brasilprev precisaram aportar entre 2020 e 2021?

Conclusão

Nesta aula, vimos como o Asset Liability Management (ALM) é fundamental para a saúde financeira de instituições que lidam com obrigações de longo prazo. Conceitos como duração, adequação de passivos e casamento de ativos/passivos podem soar teóricos, mas o estudo de caso da Brasilprev demonstrou de forma concreta seus impactos. Um descasamento significativo – seja de prazos ou indexadores – pode gerar perdas expressivas e demandar medidas emergenciais, enquanto uma boa gestão de ALM atua como amortecedor, equilibrando receitas e despesas mesmo em cenários adversos.

Recapitulando os principais aprendizados:

  • ALM: busca alinhar ativos e passivos para minimizar riscos de mercado (juros, inflação, câmbio), garantindo que a instituição possa honrar seus compromissos a qualquer momento.
  • Duração: ferramenta crucial para medir o risco de juros e calibrar a carteira. Matching de duração entre ativos e passivos é uma forma de imunização contra oscilações moderadas de taxa de juros.
  • TAP: mecanismo de controle que alerta quando os passivos futuros não estão devidamente cobertos pelos ativos. Funciona como um "sinal de alerta" para necessidade de ajuste imediato (via provisões ou capital) e evita que problemas atuariais se agravem ocultamente.
  • Descasamento vs Casamento: vimos que evitar descasamentos significativos é desejável, mas nem sempre trivial. Quando não é possível casar perfeitamente (por limitações do mercado ou legado de contratos), é preciso monitorar de perto e ter planos de contingência (capital, renegociação, etc.).
  • Derivativos: Swaps e futuros servem como valiosas ferramentas de hedge, adicionando flexibilidade ao ALM. Eles permitem transferir/exchange riscos específicos (juros, inflação, câmbio) com outras partes, embora adicionem considerações de custo e contraparte.
  • Case Brasilprev: evidenciou a importância de gestão prudente, preparação para cenários extremos e resposta ágil. Também mostrou a interdependência entre gestão de risco e necessidade de capital – no fim, um ALM inadequado consome capital dos sócios, enquanto um ALM eficiente protege o valor da empresa.

Em suma, o ALM combina ferramentas quantitativas (como duração, stress tests) com decisões estratégicas (como políticas de investimento e de produto) para garantir que, aconteça o que acontecer na economia, a instituição permaneça solvente e capaz de cumprir suas obrigações. Para você, futuro profissional do mercado financeiro, dominar esses conceitos significa estar apto a identificar e mitigar riscos sistêmicos e garantir sustentabilidade de longo prazo nas organizações em que atuar. Esperamos que este material tenha proporcionado insights valiosos sobre como teoria e prática andam juntas na gestão de ativos e passivos.

Quiz Final – Teste seu conhecimento

Teste agora, de forma abrangente, os conhecimentos adquiridos. Este quiz final contém 20 questões de múltipla escolha, cobrindo todos os tópicos abordados. Cada questão traz o feedback imediato após a seleção da resposta. Boa sorte!

Q19: "Casar" ativos e passivos significa:

Q20: Se uma seguradora tem passivos de longo prazo atualizados pela inflação, o ativo a seguir que melhor mitigaria o descasamento seria:

Q21: Qual das alternativas a seguir não é um objetivo do ALM?

Q22: Suponha que um fundo de pensão tenha duration média de seus passivos de 12 anos. Para imunizar parcialmente o risco de juros, seria recomendável que a duration da carteira de ativos estivesse:

Q23: Durante um TAP, identificou-se um "passivo a descoberto". Isso significa que:

Q24: Em cenários de estresse, como alta fora do comum de inflação ou juros, um ALM bem estruturado deve:

Q25: Qual alternativa apresenta corretamente uma dificuldade de se fazer hedge perfeito do IGP-M no caso Brasilprev?

Q26: Uma das principais lições do caso Brasilprev para a gestão de risco é:

Q27: Qual órgão regula e supervisiona empresas de previdência aberta, como a Brasilprev, no tocante a solvência e práticas atuariais?

Q28: O que é risco de base (basis risk) em hedge?

Q29: No ALM de um banco, uma preocupação constante é:

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